Hoje em dia falamos muitas vezes no aborto, ou na interrupção voluntária da gravidez ( IVG ) como lhe quiserem chamar, por ser uma tema da moda, importante é verdade, mas porque é da moda... Calha bem em tempos eleitorais falar na IVG como um tema a defender para a sua consequente, e correcta, legalização em Portugal.
Muitas são as opiniões.... Umas amadas por uns, outras amadas pelos outros, cada um com o seu ponto de vista, mais ou menos correcto, no entanto, e sem ser preciso inundar a televisão e todo o tipo de comunicação social com argumentos mais ou menos brilhantes, em discussão numa das minhas aulas entre alunos e professora, ela disse algo que "cala" todo o tipo de argumentos que possam ou não existir por aí:
" No meu corpo além de mim, ninguém manda "
E é de facto aqui que toda a discussão termina. Nós como indivíduos temos a superioridade para com o nosso próprio corpo, em relação aos demais que julgam sobre ele mandar. Passando a comparação, que admito à partida não ser a mais brilhante, eu se quero fazer um piercing ou uma tatuagem... Cortar o cabelo de forma x ou y, não há ninguém além de mim que tem de opinar sobre essa medida.
O que está em causa, é como é que outrém pode achar que decide melhor e em qualidade sobre aquilo que ao meu corpo, mental e físico, me é melhor ou mais aconselhado ? É impossível o meu " vizinho do lado " saber mais sobre mim do que eu próprio. É impossível ! Eu sei de mim e sobre as escolhas e opções que tomo, e sobre a forma como elas se poderão refletir sobre mim próprio.
Com isto tudo quero chegar à reportagem que acabou à minutos de passar no Jornal da Noite da TVI, onde o tema é outros dos proibídos ( ainda mais que a IVG ) que é a eutanásia. Sobre o mesmo ponto de vista, ninguém além de mim, manda no meu corpo. Sou "eu" que afectado por uma doença em estado terminal devo opinar sobre o "meu" fim. Sou eu que devo optar pelo momento exacto para colocar um término ao "meu" sofrimento, e em que condições deverá ser efectuado. Sou "EU" que decido ! "EU" tenho a última e a mais importante, decidiva, palavra, e não o "meu vizinho do lado". Sou "eu" que sei aquilo que passo, ou poderei passar, e não os outros que se limitam a opinar à distância, legislar sem sentimento e sem conhecer aquilo pelo que os reais indivíduos passam; os seus problemas, as suas angústias e o seu sofrimento. Não só o seu sofrimento físico, mas acima desse o seu sofrimento psicológico que corrompe a mente, corrompe a memória, corrompe o espírito e acima de tudo corrompe a liberdade própria de poder decidir sobre o que queremos fazer.
Passava o ano lectivo de 1997 - 1998, quando na escola secundária, no meu 12º ano, na disciplina de IDES ( para quem não conhece é Introdução ao Desenvolvimento Económico e Social ) em que uma da matéria dada era algo do género de " O FUTURO " onde eram debatidos vários assuntos desde a correcta utilização dos recursos naturais com vista ao uso dos mesmo pelas gerações futuras, formas de família, tecnologia, e uma das passagens dadas era exactamente a IVG e a Eutanásia, onde, nos nossos brilhantes 17 anos de idade onde o nosso próprio pensamento está na grande etapa das revoluções e das transformações, a nossa professora tem a audácia de dizer " não concebo como é que há pessoas que aprovam estas medidas " ( leia-se IVG e Eutanásia ). A minha simples pergunta é ( e foi na altura ) qual era o direito dela de questionar as opções individuais de cada um ? Quem é aquela mulher, que tem como função mostrar sempre os dois lados da moeda, para estar ali junto de uma turma de 40 pessoas dizer a pés juntos e defendendo-o como se daquilo fizesse a sua bandeira, que não compreendia a atitude das pessoas que as defendiam como medidas a serem aprovadas e legisladas. O que é que ela sabia para se tornar tão mais especialista do que os outros, utilizando apenas como seu argumento que " Todos os dias se descobrem curas e tratamentos novos " ? Ao mesmo tempo, nesse ano de 1997 - 1998, tive a minha avó no hospital, após uma vida dura cheia de doenças e enfermidades, uma quantidade de abortos ( chame-mos as coisas pelo nome ) que a deixaram com problemas de saúde durante toda a sua vida, devido às péssimas condições em que haviam sido feitos, e na clínica que esteve tinha ao seu lado uma outra senhora que tinha um cancro terminal. Tudo nela espelhava apenas uma coisa, a morte. O cheiro, a cor, o aspecto... TUDO ! Estaria esta pessoa capaz de receber um tratamento que lhe devolvesse a lucidez, depois do próprio cancro em si já lhe ter aberto feridas e chagas pelo corpo todo ? É certo que queremos ser optimistas e esperar sempre por uma cura, mas há casos e casos...
Vamos nós reclamar para nós o direito à vida de pessoas que na sua lucidez, optaram pela morte ? Por uma morte assistida, sem dor, no espaço em que se sentem à vontade, juntos dos seus entes queridos, onde possam perecer de uma forma calma, tranquila e harmoniosa ?
O único argumento que posso utilizar como conclusão deste meu desabafo é este " No meu corpo, além de mim, ninguém manda ".
Por muito que queiram passar a ideia de que tanto a IVG como a Eutanásia são actos irresponsáveis pois retiram a vida a um ser, a minha questão é só esta; não é retirar a dignidade e a liberdade a pessoas que podem estar a morrer sem dignidade ou a seres que se nascerem serão para sempre indesejados por quem os teve ? É esse tipo de pessoas que queremos ter na nossa sociedade ?
Já que na nossa última campanha eleitoral de 20 de Fevereiro se fez "prato forte" destes temas, pode ser que se lembrem agora de levar estes temas de novo à praça pública e que deixem tanto num caso como no outro, a população decidir, depois de uma séria e rigorosa campanha de esclarecimento público. Sem fantasmas nem ameaças. Apenas pelo esclarecimento !